sábado, junho 19, 2010

Vazio. Vazio por sentir o que eu não entendo, por lembrar o que eu não quero. Fomos intensas, mas erramos. Prometemos demais, fizemos de menos. Eu te queria. E, ah... Meu Deus, se eu conseguisse demonstrar. Te queria como minha amiga, numa sexta-feira chuvosa, por horas no telefone trocando confissões. Te queria como minha grande paixão, que em todas as minhas manhãs, com as pernas cambaleantes, ainda sentindo o beijo entre elas, eu te olhasse com o fervor da noite diluída. Te queria como meu amor, deitada no sereno, esperando o orvalho, me dando teu corpo como agasalho. Justifico meus erros com os teus, justifico meus medos com meu passado. Jamais fui como desejei ser... Não me escondo por querer mudar, nem por vergonha... Minhas mentiras e minhas faltas sempre foram medo, angústia. E escrevo isso como um ato de penitência. Minha confissão... Confesso que ao invés do álcool, prefiro café e chá. E que um de meus passatempos preferidos é assoprá-los enquanto faço palavras cruzadas ou observo as nuances do céu. Confesso que ao invés do cigarro, prefiro me banhar de incenso. Que ao invés do salto da noite, uso meias e pantufas. Conheço toda a programação da TV e tenho mais de 100 livros espalhados pelo quarto... Dostoiévski, Flaubert, Wilde, Machado, Alighieri, Goethe, Cervantes, Shakespeare, Balzac, Austen, Melville, Pirandello, Rudyard, Camões, Kafka, Tchekhov, Voltaire, Verga, Quiroga, Górki, Homero... Deus, como queria estar à altura! Quando saio, vou ao parque. Quando escurece, chamo um amigo, abro um vinho e fico sob a luz da lua ou ao amarelado de postes velhos. Tricoto meus cachecóis, não escrevo poemas, vou muito bem na escola, não estou apaixonada e minha melhor amiga é a solidão. Meu Deus, tenho tantos segredos... Sou tímida, sou suja, eu não presto. Culpo os outros pelos meus fracassos. Acordo quando todos estão indo dormir. Crio histórias baseadas nas que eu leio. Sou muito açúcar. Sou toda a falta de graça. Pinto quadros coloridos, as minhas melodias no violino sempre saem arranhadas. Não vou em bares, vou a concertos de música... Haydn, Prokofiev, Sibelius, Tchaikovsky, Mozart, Stamitz, Beethoven, Bach, Brahms, Glinka, Dentello, Grieg, Schubert, Wieniawski, Elgar, Smetana, Ravel... Deus, como eu queria estar à altura! Queria morar no campo, esquentar o leite na panela, passar a vida escrevendo e sentindo o tempo se arrastar. Teria lugares mais perto de mim para plantar minhas flores. Teria mais para oferecer para quem me amasse. Mas me adaptei a vida urbana, serei médica um dia. Alegrarei crianças leucêmicas. Eu, provavelmente, serei o último sorriso de muitas delas. Sabe, eu lavo minhas roupas, durmo com três travesseiros, sou guardiã de muitos segredos. Sou babá nas férias, e sento ao lado de idosos que já se esqueceram de como a vida foi bela para colocar o papo para fora. Nas manhãs de sábado, cuido de cachorros num canil. Aos domingos, almoço com a minha família. Nas sextas, faço piqueniques enormes com pizzas vegetarianas, incenso de flores e bossa nova escoando pelo parque florestal. Sou toda a calma... Sou toda pequena... Que nem meus milhares de amigos que mal tem um metro de altura. Minhas cartas nunca foram pedidos de perdão, pois jamais pretendi enviá-las. Já errei tantas vezes que me acostumei com o gosto amargo. Mas agora sinto um vazio cheio de culpa, dor, tristeza e remorso. São tantos caminhos, quase todos sempre errados... Hoje me livrei de minhas mentiras e da minha auto-enganação, mas meu passado... Foi solificado e irá perpetuar em mim para sempre... Quem sabe um dia eu esqueça... Apenas sei que até lá, irei ficar com meus relógios, meus suéteres, minhas meias, minhas músicas, meus livros, meus cafés, meus chás, com a minha vidinha insignificante. Esperando que um dia ela se torne importante, o suficiente para que eu possa ser a melhor amiga de uma alminha que se vai.

Me desculpe se um dia eu tenha sido a causa de uma dor tua.